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(Sinónimo de) Carmezim

(Sinónimo de) Carmezim

03
Mar17

Marta vai ao estágio #1

Há várias coisas na vida que se me perguntassem há dois ou três anos atrás, eu vos diría que jamais seria capaz de as fazer. Se me contassem que faria certas coisas eu ia rir-me na vossa cara. Não porque não achasse que ia ser boa ou que me ia sair bem, mas sim porque achava que não ia ser a melhor, ser perfeita. Pode parecer que estou a cair no clichê do "sou tão perfecionista, olhem para mim", mas a verdade é que sou mesmo e que em tempos via isso como sendo apenas uma qualidade. Hoje, consigo ver como isso não me deixou arriscar tantas vezes, em tanta coisa. Tenho amigas que dizem que isso faz parte do meu signo. Seja ou não, a verdade é que sou assim desde que me lembro de ser pessoa. 

 

Durante muito tempo fui aquela pessoa que nem sequer experimentava se não soubesse que ia fazer bem. Um dos primeiros exemplos que tenho que estava totalmente errada em pensar assim foram as primeiras vezes que subi a um palco. Eu ensaiava em casa, é verdade - mas tinha sempre uma vozinha que me dizia que quando chegasse o momento, não ia ser capaz de subir ao palco. Quando o momento chegava, surgia outra vozinha que gritava mais alto e que me dizia "caraças, se ensaiaste, agora tens de ir e acabou a conversa." E eu ia. No final, posso dizer que a única pessoa mais vaidosa que o meu pai ou as minhas avós, era eu. Aprendi aí que sou tão teimosa que adoro contrariar-me a mim mesma. 

 

Outro exemplo destes foi arrancar os sisos. Riram-se, não foi? É verdade. Quem me conhece sabe que a minha tolerância à dor é praticamente nula. Sequer imaginar aquelas histórias de terror que se contam de como é arrancar um siso fazia-me fugir do dentista a partir do dia em que comecei a sentir um altinho lá atrás. 

Até que chegou um dia em que o altinho ficou uma autêntica montanha na minha boca. Tive que ser eu a pedir para ir, a implorar. Cheguei lá e quis fugir, mas depois pensei "caraças, tu é que pediste para cá vir. Agora arrancas isso e acabou a conversa". E eu arranquei. 

 

Os anos foram passando e situações como estas foram-se tornando cada vez mais normais. Até ir almoçar pela primeira vez à casa da linda, da amorosa avó do meu Rapaz. Só eu sei como queria que ela visse que eu sou a neta perfeita e só eu sei como estava nervosa. "Já cá estás, agora vais mostrar como és a mulher da vida deste miúdo e acabou a conversa". E continuo a mostrar.

 

Hoje houve outro desses momentos, mas desta vez daqueles mesmo grandes em que sinto que cresci cinco metros. Hoje tive o meu primeiro dia de trabalho. Achei que, caso fosse para a frente com a candidatura, iria estar lá meia perdida e que não ia ser capaz de ser rápida, desenrascada e que viria a chorar para casa. Hoje, parecia que transpirava de tanta correria. Tinha as mãos cheias de pó e ainda sinto comichão no nariz do cheiro a tralha em que mexi hoje. Percebi os códigos da base de dados. Vi erros e corrigi-os. Não tive vergonha de perguntar coisas. Tinha uma secretária e um computador para mim. Ouvi um "estás a perceber bem disto!". O dia ia passando e menos vontade tinha de ir embora - fez lembrar o primeiro dia no infantário. 

 

Isto pode parecer tosco, mas para mim é enorme. Alguma vez a Marta de há uns anos atrás imaginava um dia assim? Nem sequer a Marta de ontem! Isto é a primeira parte do maior sonho da minha vida. É o passinho que eu precisava para acreditar que sou capaz de ser boa na área que escolhi, sem nunca a ter experimentado. É o passinho que precisava para acreditar que estou mais perto da minha casinha e do meu cão, para dormir conosco. 

 

Hoje também ouvi um "Tens que acreditar no teu potêncial, Marta." E é verdade. Hoje vou dormir a acreditar um pouco mais em mim. 

 

Gostar do que se faz é (Sinónimo de) Carmezim.

Marta.

16
Fev17

Quando o cheiro a mofo é cheiro a rosas

Hoje tive uma noite terrível. Os sonhos foram estúpidos e deixaram-me cansada assim que acordei. O despertador também tocou mais cedo do que o costume: marcava 6h30 da manhã. Hoje ia ter que me maquilhar, porra. Não que não goste, muito pelo contrário, mas de manhã, chega-me o rímel para um dia normal. Hoje não ia ser um dia normal. 

 

Próximo passo: escolher a roupa. Não queria ir de calças de ganga. Escolhi as de fato, aquelas pretas, que se usam em ocasiões especiais e funerais - mas gosto delas. Mostram a canela, dá para usar os meus ténis brancos, e acabam por ser só qb formal. Ideal para hoje.

 

Depois, lá me maquilhei. Resmas de corretor nas borbulhas do stress dos últimos dias. Bolas, foi demais. "Agora tens que abusar no bronzeador, só para não pareceres mais pálida do que és sem nada disto na cara." Ponho o rímel e dou um toque nas sobrancelhas: "estás viva." Tive que usar o batom da Mac - detesto usá-lo desde que descobri que testam em animais, mas hoje, era o rosa perfeito para o efeito. 

 

Autocarro, direto pela auto-estrada - acreditem, são poucos. 8h30 no Campo Grande. 9h02 no Marquês de Pombal. "Bolas, e agora qual é a paragem certa?". Lá tive que recorrer aos prints que tirei do Google Maps. Autocarro 732 às 9h06. Fiz-me ao caminho, com o nervoso graúdo a dar-me pontapés no estômago. 9h35 no destino. Cheguei uma hora mais cedo, mas conhecendo como me conheço, as probabilidades de me perder eram enormes. Foi melhor assim.

 

Enquanto tomava o pequeno-almoço num café simpático das redondezas, imaginei-me ali todas as manhãs antes de ir trabalhar - gostei da imagem... e da merenda mista. Para meu espanto, consegui comer tudo sem estar mal disposta de nervos, mas depois vi as horas. 10h11. Faltavam 19 minutos para a entrevista. 

 

Fui andando e fiquei de plantão à espera que chegasse a hora, pensando em todas as perguntas que me poderiam fazer na minha primeira entrevista de sempre. "Mas eu sou péssima a falar de mim!!!" Bati à porta às 10h28 - adiantada qb. "Tens que mostrar que és pontual."

 

A entrevista começou e eu fiquei assustada: "Pelo teu currículo, não percebi bem porque é que escolheste vir para aqui." Acreditem, ouvir isto da boca de alguém que coordena um dos sítios para onde vocês gostavam de vir a trabalhar, é um grande choque. Começam a questionar se o percurso académico e profissional que desenharam para vocês está todo errado, e que passaram os últimos 4 anos a viver em Nárnia. 

Lá expliquei. "AHHHH! Pronto, assim compreendo. É que com estes nomes dos cursos de hoje em dia, nós empresas, nunca percebemos bem o que é que vocês estudam!" Respirei fundo e ri-me. A conversa continuou. Quanto mais me diziam o trabalho que ali faziam, mais eu ficava com os olhos a brilhar.

 

Discutimos horários e aceitaram a minha proposta - toda a condizer com o horário do Rapaz. Aceitaram os dias em que iria lá trabalhar - sobretudo quando lhe disse que demoro cerca de duas horas e meia a lá chegar. Falei dos dias do carnaval, perguntando se poderia não ir nesses dias, aproveitar as férias da faculdade e compensar as horas noutro dia: "Querida, não te preocupes, pus férias nessa altura. Se cá ficares conosco, começas em março." Os meus olhos brilharam mais, respirei mais fundo. "Entro em contacto contigo quando falar com o meu administrador, mas agora podes dar uma vista de olhos às instalações." 

 

Apertámos a mão e lá fui eu explorar. Os nervos saiam-me pela ponta dos dedos que tremiam mais agora do que durante a entrevista. Quando dei por mim, estava rodeada de vitrines com tralha - como qualquer pessoa normal lhe chamaria - com o seu quê de cheiro a velho - mais propriamente do séc. XVIII e não me poderia sentir mais feliz.

 

Só queria pegar em tudo com luvas, limpar, tomar conta, contar a sua história: quem o deu, para que serviu, como se chama, de que país veio, que importância teve no seu tempo e porque é que merece estar num museu, junto do público. 

Só quero estar rodeada de tralha velhinha. Vamos fazer figas. 

 

Ser estagiária é (Sinónimo de) Carmezim - vamos lá ver!

Marta.

02
Fev17

Entre o "olá outra vez" e o "é desta!"

Sabem aquelas pessoas que tentam combater um vício durante anos, tudo parece estar a correr às mil maravilhas, até que se dá uma recaída? Eu fui uma dessas pessoas, e durante anos - note-se, tenho só 21 - o meu vício era ser pesarosa, melancólica e, no fundo, triste. Achava tanta graça a isso, achava as pessoas que assim o eram tão fascinantes e hoje... bem, hoje riu-me dessa miúda, num misto de pena e gratidão por ela já ter percebido que, convenhamos, assim não dá.  

 

Para combater esse meu vício recorria aos blogs. Já nem sei o número deste, se os formos contar como "tentativa 1", "tentativa 2" e por aí fora. Sempre fora esse o meu método: estás triste? Então escreve. Podia aqui romantizar a coisa, dizer que era uma espécie de escape, mas não. Na maior parte das vezes, eu estava assim, eu escrevia assim, porque queria. Gostava de me sentar sozinha em cafés a ler o Livro do Desassossego, gostava de tudo o que conseguisse ser mais sombrio do que aquilo que eu sabia ser. Eu, então essa pobre miúda, achava que só iria conseguir criar algo de que me orgulhasse - e mais, de que os outros gostassem - se fosse triste ou melancólico (deprimente, até) porque essas eram as únicas emoções que valiam realmente a pena ser sentidas. 

 

Pobre miúda. Prova de que todo este método está errado? O momento da recaída - desisti de todos. Apagava e voltava a criar. Nomes diferentes, uns em nome próprio, outros com alter-egos (pseudónimos, claro, para me sentir mais próxima de me tornar tão torturada quanto o Pessoa). Tudo caiu no pior dos esquecimentos: no meu próprio. 

 

No ano em que me licencio na Faculdade de Letras de Lisboa, em que vou estagiar, começar o mestrado, começar a trabalhar, em que me vou mudar e arranjar um cachorrinho para me aquecer os pés quando o meu namorado não puder... acho que não haveria mesmo melhor momento para recomeçar a fazer algo de que tanto gosto, gostando hoje tanto de mim e dos que me rodeiam. 

 

Hoje, regresso aqui com a vontade de gritar "é desta!". Ao fim de talvez 3 anos após a minha última tentativa, vou experimentar um novo método: e se eu experimentar escrever, estando feliz? Estando a saltar para fora de mim própria de feliz? Aquele feliz que pode correr o risco de meter nojo, porque as coisas até estão a correr como se quer? É que se há uns anos havia uma miúda que apelidavam de gótica e que metia nojo de zangada com o mundo - vá-se lá saber porquê - hoje olho para mim como uma mulher feliz, que não mete menos nojo por isso. Suponho que essa seja realmente a minha cena: meter nojo. E neste cantinho, mesmo que seja só o meu namorado e a minha mãe a ler, espero meter nojo durante muito tempo.

 

E sim: o nome é mesmo com Z.

Vamos ser felizes aqui, sim? É desta!

Eu sou (Sinónimo de) Carmezim

Marta

Sinonimo de Carmezim

Sou a Marta e gosto de escrever umas coisas de vez em quando.

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